quarta-feira, 2 de maio de 2012

Chegas-te tomada de sol e de panico


Chegas-te tomada de sol e de panico. A tua mãe está sentada tricotando duvidas, acelarando no seu tricotar as águas passadas da vida, da casa, do matrimónio, da espera de te sentir nascer. Chegas num panico de perguntas, tomas-te no pulso a existencia, olhas a tua mãe e a sua tristeza, nem sempre percebeste, talvez porque se previa que irias andar ocupada na aventura de saltares da tua janela domestica para o mundo. Ajudas-te a tua mãe a preparar o jantar, dentro da tua cabeça tu tinhas fome de planos e cozinhavas tudo secretamente. A tua mãe perguntava-te raramente sobre os estudos, a tua resposta era o mesmo ritual entre o sim e o não, as boas noites e as boas tardes e depois ambas ficavam caladas como a não querer perturbar algo muito frágil e muito pessoal. A serra circundava como braços de árvore em volta da terra, aquelas paisagens, o cheiro frio daquele lugar, as ovelhas melancólicas e tu e a tua mãe naquela ausencia humana desaguada para a cidade, para o trabalho nas fábricas, para a vida das crianças nas escolas. Tu desejavas a cidade e no teu intimo a cidade era um cão que tu chamavas para guardar o rebanho da tua vida e o levar a outras pastagens do mundo. Tinhas estes pensamentos enquanto ordenhavas as cabras, o sabor fresco do leite, como se aquele sabor fosse tão genuino como o primeiro leite da criação. A tua mãe preparava-te a comida e arrumava-te os livros que o caminho era longo e não havia transporte... mas tu tinhas fome de espreitar os livros, de escutar a voz que imaginavas no Constantino guardador de vacas e de sonhos, se fosse possivel contraias matrimónio com todos os constantinos guardadores de vidas e de esperanças. Fazias o liceu, a tua vontade era ensinar as crianças, ensinalas que antes dos livros escritos, são as mãos na terra e o que se descobre na terra, nos olhos que indagam tudo é que os livros sem o contacto e sem a experiêcia não nos levam ao florescer. Tu ensinarias no propósito de receber, partilhar emoções, essas que não conseguias partilhar com a tua mãe. Tu na tua casa tinhas como refeição para a fome do teu calor o fogo crepitante da fogueira e a sopa de muitas ervas, de muitas variedades de verde e de roxo. Aquele calor fazia muita falta na vossa solidão, tu não a tinhas tão forte como a tua mãe. Depois da morte de teu pai ela não procurara outro homem, somente num certo dia de Abril, um homem mistura de viajante e de mistico, um poeta, um absoluto solitário que não tem nada mas que nele tudo se precisa e tudo se entende. A tua mãe naquele dia tomou para si os braços dele e a boca dele, sofregamente não quiz perder toda aquela vida, aquela vontade de ver num ser, no mais pequeno ser o grande universo da sua força de amar e ver o amor. Ela arrancou á terra, arrancou do corpo dele agudos gemidos, os gemidos dela tão fortes quebraram o gelo acumulado anos e anos, ela tão nua, nua como os olhos que se abrem desejou a brutalidade do amor rude, desejou que ele dominasse a natureza dela, que ele fizesse a jura mais seria, tinha de ser um pacto tão forte... aquele dia seria a consequencia de muitas decisões, aquele amor de uma memória dolorosa, também as raizes da terra haviam de guardar e de transformar aquela sexualidade, como se aquele momento perdurasse. Naquela noite toda a religião, todo o medo do pecado, o medo e a vergonha que não deixou que antes a tua mãe se sentisse livre e suja, livre e absoluta, segura de uma verdade tão próxima da natureza, tão poderosa como os ensinamentos do Deus que a igreja castrou atravez do poder da sua hierarquia. O grande pecado seria calar o prazer, seria não aceitar a sua força na força da água que rasga as pedras que entram como dedos na sua humida vagina. Tu no teu quarto sentias aquela transpiração, era como se assistisses ao plano da criação, era como se concentrassem nela o poder de todos os nascimentos. Todos os dias despertavas muito cedo, tratavas da criação e regavas a terra, depois vinha o Manel carteiro na sua mota e levava-te até á próxima povoação onde apanhavas o autocarro até ao liceu onde estudavas. Tu gostavas do estudo da zoologia e da botanica, gostavas de estudar a natureza como um livro aberto como o céu, cada árvore falava uma linguagem, cada pássaro tinha uma geografia, os teus colegas tinham outros interesses, tu estavas mais próxima das coisas que para eles eram coisas comuns, tu gostavas da terra de um modo que te absorvia, a terra como um ser que caminha, quando os homens caminham... os outros norteavam a vida na ambição de muito dinheiro, de muito prestigio, de muito ouro

lobo

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