segunda-feira, 25 de março de 2013

Domadora de borboletas


Abres os braços
e na ponta dos dedos
pousam-te borboletas azuis

Ou será que é o vento
a abraçar teu corpo
de porcelana?


Levantas o vestido
como quem chama a noite
e há um sobressalto de estrelas
a incendiar o horizonte

Ou serão borboletas fugazes
simulando
com o celofane das asas
a metamorfose do teu corpo despido?

domingo, 17 de março de 2013

As brancas do meu pensamento

?

Doravante quero todas as casas da minha rua pintadas de branco
E em todas as janelas cortinas brancas
De um branco intencional, como as cortinas da minha janela

E todos os carros devem ser brancos também, sem excepção.

[Então, com a rua toda de branco, de tão previsível que será
Será única, saberei que é a minha sem precisar olhar para ela.]

E esta comodidade, sem que ninguém desconfie
Far-me-á sentir cómodo, com as brancas do meu pensamento.

sábado, 16 de março de 2013

RIO

Foto: ms

Contemplo o Rio Douro, séculos de água a deslizar
A caminho do mar, sonho e pesadelo de multidões
Que criaram laços com a água opaca, às vezes verde
Outras vezes castanha, das terras que trás consigo

Fico a olhar as cores vivas do casario velho em cascata
Uma travessia diáfana pela estrada líquida, inquieta
Com vontade de navegar e ir nessa corrente determinada
Tocar o mar, e olhar para a profundeza deslumbrante

Desprendo-me do cais e vou com a brisa fria, como gaivota
Na luz do sol descendente do fim da tarde, na magia do lilás
Ouvindo as vozes sonoras de outrora, no pulsar das águas!

O barulho das naus, o espalhafato das suas velas endemoninhadas
O avanço solitário de cada um, olhando em frente a vida
O caminho incerto, das tempestades e das fulgências do amanhã

sexta-feira, 8 de março de 2013

MEMÓRIA SENTIDA!


Subo a montanha de pedras em busca de água
Água da vida, para parir a vida no meu corpo, seco
A água que escorrega, que limpa as lágrimas negras
No meu solo sedento, na via-sacra da minha sede

Quero voltar a mergulhar o meu rosto nos teus cabelos
Perder-me nos teus olhos de água, ciano e magenta
Tu que és mais quente que o sol, que borbulhas de suor
E que me habitaste fundo, deixando-me em chaga

Desvendaste os teus segredos, senti os teus furores
Acariciaste os meus suspiros, de solitário cio reprimido
E foste uma divina fonte de amor, solidária e jorrante

Agora moras no meu castelo de sonhos, que criei no anseio
Nos degraus do desejo pulsante nas veias, que sinto latejar
E deixas-me entumecida e delirante, no desejo cego de ti

TU QUE EXISTES LATENTE EM TUDO…


Só tu me amparas neste mundo inóspito…
As vagas uivam, rugem furiosamente
O nevoeiro é cerrado e espesso
A ira do mar parece uma agonia
Enraivecida em catadupas de espuma
De violento excesso!

De cabelo emaranhado
Os olhos ficam parados no desvario do pavor
Sinto a angústia do desamparo
E de coração rasgado
Corro para ti meu amor
E aperto nos meus braços
O teu corpo gelado
Tão faminto de enlaços!

O QUE DE AR SE FEZ PEDRA


Fonte de luz que faz da noite dia…
Cercas-me, abraças-me seguras-me, prendes-me
E eu deliro…
Difícil suster a comoção
A lágrima deslizante
A emoção da felicidade….
Nasci nascendo em ti
Toda a vida anterior
Ficou perdida
Na musicalidade
Do teu corpo de cisne
Até ao nó cego…
Animo, atracção, desejo, tumulto
És a pessoa incontornável
À minha felicidade e esperança
Que andou sempre adiada!

domingo, 3 de março de 2013

Já não me assusta o fantasma das horas



Já não me assusta o fantasma das horas
nem o amargo sabor da espera
sou como pássaro furtivo planando
numa candeia dispara de quimeras.

Já não me assustam as horas
os segundos pontiagudos do tempo
sou cântico boiando ao vento
nesse teu vento macio e quente

Já não me assusta o medo de ter medo
nem a saudade que sempre me espera
sou tronco enraizado em terra ardente
e nuvem deslizando no céu imenso

Já não me assusta o fantasma das horas


Escrito 2/03/13

sexta-feira, 1 de março de 2013

Crescimentos

Crescimentos


Assola-me um medo de desperdício
Sem vício

De oportunidades perdidas
Cem vidas
E quantas mais serão
Sem coração
Capaz de vencer a mente
Sem presente
E passados fustigados
Abandonados
E futuros avistados
Não concretizados.


Assola-me uma rotina
Sem retina
Em si mesma fechada
Acomodada
Ao conforto imaginário
É calvário
Para o ser interior
É superior
Mas posterior às obrigações
Perpetuações
De um crescimento universal
Mas…
Terá assim mal?
Rotina é vida
Mas vida é muito mais
Que rotina!



Clarisse Silva
1 de Novembro de 2012 © Direitos de autor reservados.