sexta-feira, 30 de agosto de 2013

crédula esperança



estou dos versos esquecida
me anima uma crédula esperança
que o que me resta de vida
é esta saudade nua e crua
que de lembrar não me cansa.
e este ânimo constante
que me vem ao semblante
que sempre assim em mim esteja.
quero que todo o mundo veja
que aos versos não ando atada
mas anda louco o pensamento
e a alma arrebatada...

a morrer sentenciada
anda a minha poesia
no silêncio e esquecimento...
se pudesse a pouparia.

já fui moça...moça ardente
já fiz versos de repente

estou dos versos esquecida
eles que foram meus amantes
deram golpes ficou a ferida
já nada é como dantes...
versos que eram raridade
onde conservava a saudade
hoje resta a aparência
nada tinham de ciência
quem sabe...a eternidade!

não deixo que nada me entristeça
a vida é cruel ameaça
só a lembrança me estremeça
para esquecer qualquer desgraça
e se a vida me consente
caminhar sem receio
a minha metade igualmente!?
então:
farei da caminhada passeio.

natalia nuno
rosafogo

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Calo-me para que não oiças o gemido

Calo-me para que não oiças o gemido
nem sintas o uivo do vento na tua face ausente
para que eu te possa escutar, fecunda dum olhar… quente

Calo-me…de tantas vezes que choro, sem soluços
como quem pede uma prece, calando o verbo inerte
no sepulcro silente dos meus lábios,  incongruentes

Calo-me no fulgor da palavra, despindo a madrugada
numa quietude perigosa, lavrando o poema cansado
e no silencio visto-me subtilmente, do verbo ainda quente.
fluindo centelhas nos olhos esquecidos, longínquos de ti

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Toca a figura que caminha
desenha a figura sobre a água
inventa uma linha
para cortar o corpo
e faz aquela dança mas não convides a morte
mesmo que não tenha par.

Toca a figura que caminha
o sangue que corre vai pintar a lua
inventa uma linha
sobre a pele nua
uma flor e um cântico antigo
e faz aquela dança quando se aproxima a liberdade

Toca a figura que caminha
e cruza os dedos e faz a jura
inventa uma linha para cortar a noite
a sorte levando o jogo
para a sorte que não tem o amor

Toca a figura que caminha
desenha a figura sobre a terra
uma sombra vai abrigar a canção
e proteger-te das feridas da guerra

Toca a figura que caminha
desenha a figura sobre a água
inventa uma linha
para cortar o corpo
e faz aquela dança mas não convides a morte
mesmo que não tenha par.


lobo
o é o homem que decide, não é guiado pelo pensamento, a emoção ou a racionalidade existe mas não decide, o que decide é a maquina, é a maquina que indica o que fazer como fazer, o momento de rir, o momento de chorar, as horas de trabalho, o tempo de lazer. A maquina está instalada, indica os programas que devemos ver, os livros que temos de ler, as vezes que devemos fazer sexo. O homem não decide, o que decide nele é o mecanismo de prazer que é o mecanismo de submissão, o casamento social formaliza essa submissão, todo o homem está dependente de um contrato, não há liberdade quando se compromete a fazer o socialmente certo, é tudo contabilizado, os ruídos da respiração, tudo está cronometrado, os beijos que dá, os desabafos, as declarações de rendimentos, o perfume que usa, as vezes que chamou filho da puta ao patrão e bebeu sumo sem gaz . A máquina decide, decide tudo, o capitalismo decide tudo, como te vestes, como te controla, está tudo medido, sempre os mesmos ingredientes, a maquina faz te bonito, jovem produtivo e depois vais avariando, ficas velho, doente, fraco, os fios da televisão nos pulsos, queres que desliguem a máquina? Não tu não queres, estás feliz, eles tratam de ti


lobo
Imagino o gato que vê o frio dentro das pessoas. Imagino que podias tocar para mim uma musica é suficiente que te esqueças das palavras e te lembres do café quente, imagino que passas na igreja e que todos os homens sabem a oração do teu corpo e o gato que eu imagino fica amigo dos ratos e não percebe os homens a comer os homens, saberá um gato o que significa capitalismo. Imagino o gato que vê o frio dentro das pessoas, imagino que podias inventar uma musica, que pudesses lançar na terra e isso seria a tua resposta quando te perguntassem como nascem as flores, imagino o gato que vê dentro das pessoas. As janelas todas fechadas e uma pessoa estranha, era como se estivesse ali o mar, uma relação intima entre a minha distancia e as coisas que não entendo, imagino que podias tocar para mim uma musica, imagino que afinal não sabes nenhuma musica nem nenhuma palavra mas que tens uma maneira de dar confiança e de compartilhar uma bebida e uma pedra para a construção de uma casa. Imagino o gato que vê o frio dentro das pessoas, imagino que passas na igreja e que todos os homens sabem a oração do teu corpo


lobo

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

poema de amor também...



lanço a rede ao fundo,
para vislumbrar o poema
feito de palavra de nada
ou do que não foi dito ainda,
talvez da palavra calada,
duma porta fechada ou aberta,
alento de minha boca
uma dor que aperta,
memória dum tempo
ou da minha força, já pouca.

será o poema pássaro
que voa para o poente
de asas fatigadas
tocando as águas do mar
rumando à eternidade
docemente,
levando com ele meu olhar?

este poema é cego
e causa-me calafrio!
os seus resignados olhos,
são os meus,
às vezes são rio
que já corria
no ventre de minha mãe,
num sussurro morno
onde não há volta.
mas ainda assim me alegro,
porque este poema
é de amor também.

natalia nuno
rosafogo