Tomo café com cheirinho, olho a rapariga que segue o troço ferroviário, ela parece uma ave, dessas de pernas longas e magras. - Ela é a filha do moleiro diz do balcão o dono do bar, um homem gordo e calvo que morou muitos anos na Suíça e juntou dinheiro para investir naquele negócio e que quer ficar ali o resto dos dias. - A rapariga é bonita digo eu que sou novo ali. - Tem muitos a lançar a rede. Na estrada onde fica o café passa o carro dos bombeiros. Mais um incêndio sussurra alguém, outro acrescenta que noutros lugares o problema é a água, no Paquistão a água roubou o pão da terra, roubou o milho, o feijão, uma coisa de meter dó, aquela água toda ceifou muitas vidas, fez correr muito pranto e ranger de dentes. Aquela gente precisa de ajuda, em toda a parte se precisa de ajuda, aqui as nossas crianças precisam de pão para terem força para aprenderem as lições dos livros e os nossos velhos precisam de ter as garrafas cheias de vinho e dos filhos á conversa com eles e dos netos a moerem-lhes o juízo para que se sintam vivos e não se sintam inúteis. Para os velhos há dois lugares; ou a morgue ou o lar, mas pode ser se um velho importante, um velho intelectual, um desses poetas que nos enchem a vida de ilusões, que vão viver para uma ilha nas Canárias, que vão representar o orgulho que não temos, que são como o grande futebolista que marca os golos que não conseguimos marcar. Nós os pobres, os anónimos deixamos as bolas entrar, estamos frustrados, não conseguimos defender nada. Sabe uma coisa os políticos sabem que somos uns falhados e eles com as promessas que nos fazem inventam a ambição que não temos, nós não acreditamos nos políticos, eles são como um comboio que nunca vamos apanhar mas que nunca desistimos de correr atrás. Os pobres andam sempre a correr para o passado, a pobreza tem medo do futuro e é por isso que os pobres jogam aos jogos de azar e se imaginam os heróis da descoberta da índia e fazem do seu vizinho um Mouro a combater e ouvem as histórias da mil e uma noites em que os pobres se tornam ricos e os dragões acabam numa clínica de desintoxicação por causa da dependência ao ópio. .Tomo café com cheirinho, olho a rapariga que segue o troço ferroviário, ela parece uma ave, dessas de pernas longas e magras. - Ela é a filha do moleiro diz do balcão o dono do bar, um homem gordo e calvo que morou muitos anos na Suíça e juntou dinheiro para investir naquele negócio e que quer ficar ali o resto dos dias. - A rapariga é bonita digo eu que sou novo ali. - Tem muitos a lançar a rede. Na estrada onde fica o café passa o carro dos bombeiros. Mais um incêndio sussurra alguém, outro acrescenta que noutros lugares o problema é a água, no Paquistão a água roubou o pão da terra, roubou o milho, o feijão, uma coisa de meter dó, aquela água toda ceifou muitas vidas, fez correr muito pranto e ranger de dentes. Aquela gente precisa de ajuda, em toda a parte se precisa de ajuda, aqui as nossas crianças precisam de pão para terem força para aprenderem as lições dos livros e os nossos velhos precisam de ter as garrafas cheias de vinho e dos filhos á conversa com eles e dos netos a moerem-lhes o juízo para que se sintam vivos e não se sintam inúteis. Para os velhos há dois lugares; ou a morgue ou o lar, mas pode ser se um velho importante, um velho intelectual, um desses poetas que nos enchem a vida de ilusões, que vão viver para uma ilha nas Canárias, que vão representar o orgulho que não temos, que são como o grande futebolista que marca os golos que não conseguimos marcar. Nós os pobres, os anónimos deixamos as bolas entrar, estamos frustrados, não conseguimos defender nada. Sabe uma coisa os políticos sabem que somos uns falhados e eles com as promessas que nos fazem inventam a ambição que não temos, nós não acreditamos nos políticos, eles são como um comboio que nunca vamos apanhar mas que nunca desistimos de correr atrás. Os pobres andam sempre a correr para o passado, a pobreza tem medo do futuro e é por isso que os pobres jogam aos jogos de azar e se imaginam os heróis da descoberta da índia e fazem do seu vizinho um Mouro a combater e ouvem as histórias da mil e uma noites em que os pobres se tornam ricos e os dragões acabam numa clínica de desintoxicação por causa da dependência ao ópio .A mulher do dono do café, xaile sobre os ombros pergunta: - Jovem você acredita que os homens foram á lua, acredita que eles foram naquele transporte que parece aquela coisa que os homens põem nas partes por causa dessas doenças modernas, você acredita, eu não sei se deva acreditar, tinha de ver com os meus olhos. - Não sei se eles foram lá, não quero saber, pessoalmente imaginar ir á lua é como ter uma iguaria ao pé dos olhos e não poder comer, quem nunca saiu daqui fazer a mais pequena viagem deve ser como não conseguir dar uma explicação para o primeiro clímax, para tudo há sempre uma sensação, o cozinheiro que frita um ovo pela primeira vez sente-se o mais importante chefe de cozinha. Ele vai figurar no livro dos recordes como o primeiro cozinheiro a dar ao mundo o ovo estrelado que cai no prato tal ginasta a fazer o triplo salto e a cair direito com os dois pés no chão. Sabe não faz mal acreditar, acreditar é uma razão para viver, nós vivemos porque temos sonhos e é isso que nos dá força quando não encontramos o corrimão que nos ajude a subir as escadas. - O meu marido foi esse corrimão, sempre lhe fui fiel, só ele me convencia a crer no impossível, por isso casei e lhe jurei obediência, sou católica apostólica e Romana. O homem ir na lua é coisa do diabo, já não bastava os Russos comerem as crianças... - A Senhora quando morrer vai para o céu. - Claro que vou para o céu, para onde havia de ir?! - Pode não haver vagas. - O céu não é a função publica, esses gajos vão todos para o inferno, olhe já viu como vivem esses tipos, andam sempre a pedir aumento e os ciganos que recebem dez rendimentos mínimos, até os cães recebem o rendimento mínimo. Eu sei quem punha isto nos eixos. - Olhe minha Senhora o rendimento mínimo tem ajudado muita gente, imagine se o nosso grande poeta no tempo dele tivesse este apoio social. - Camões foi um grande poeta, outro dia fui ver no teatro a Inês de Castro, a minha filha fazia de Inês quando chegou aquela parte em que os marginais a iam matar peguei no telemóvel e liguei á guarda, não podia consentir uma coisa daquelas, sei que aquilo era tudo a fingir mas naquele momento fiquei fora de mim, eu sou mãe, posso parecer uma pessoa dura mas na verdade tenho um coração de manteiga, costumo dar donativos para os pretinhos em África e para o canil municipal, pobres dos cãozinhos, o nosso perdigueiro costuma levar coisas da mercearia aos nossos clientes, o animal é inteligente, até sabe distinguir um cheque careca de um cheque com cobertura. - Ainda há-de trabalhar num bar, talvez no BPN. - Coitados daqueles que puseram lá o dinheirinho. - Sirva-me uma imperial - Com este calor sabe bem, eu bebo muita água e na comida não deito sal, o meu marido diz que eu deito sal no prato da vida alheia, eu só gosto de conversar e isso não tem mal, você é um rapaz novo, não sei se está comprometido, sonho para a minha filha que ela case com um médico, uma vez sonhei que um médico auscultava notas de cem, não gostava vê-la casada com um artista ou com um dono de café, nós queremos ter orgulho nela. - A sua filha gosta de teatro e se ela quiser ser actriz. - Se ela tiver essa vontade, a minha filha é maior e vacinada. - Penso que o mais importante é ela ser feliz mesmo que fosse a tirar bicas. - Mas eu gostava de ver a minha filha casada com um médico, colar o diploma na vitrina do estabelecimento para os invejosos se roerem, depois podia morrer em paz. - E a sua filha quer casar? - A minha filha diz que os homens não dão utopia á vida. - A utopia aparece com os filhos, o meu pai contava que com o primeiro filho se sentiu um Hércules a segurar dois mundos. - Sim os filhos fazem-nos acreditar no impossível, olhe você sabe quem cá esteve?! - Não - O professor Cavaco silva, fiz questão de lhe servir um café, é um homem de trabalho, subiu a pulso na vida, acho que ele não vai deixar os maricas casar, aqui em frente moram dois, acho que os dois são médicos, nem que eu estivesse a morrer... costumam vir aqui, costumo rezar por essa gente. - Cada um faz o que quer, a mim não me faz mossa. - Lá na televisão é que estão bem, eu gosta daquele maricas da televisão, costumo ver aquele programa das manhãs, a minha filha diz que não se deve falar maricas, que é mais correcto homossexual, é como promover o soldado raso a general, ideias modernas, se eu governasse isto ia com pau de marmeleiro, sabe o meu marido nunca me tocou, não lhe dei motivos, sempre me soube comportar, as mulheres agora não se sabem por no seu lugar, querem ser iguais aos homens, querem independência, usam as mini saias cada vez mais levantadas, vê-se tudo , outro dia estava cá uma rapariga quando se baixava mostrava o rabo, tinha vontade de lhe pregar um par de estalos, isto é uma casa séria. Começa a chover, saio para comprar o jornal, tenho andado a pensar escrever um romance ou propor uma crónica na rádio, vou talvez tentar escrever o diário da roupa suja.
| |
Sem comentários:
Enviar um comentário