sábado, 25 de outubro de 2014
Tenho em mim
nada do que poderia
ter.
Tenho tudo o que
terei
para ser
aquilo que já
sou.
Tudo do nada
acomodada
empreitada
fatigada
caminhada
para o nada.
Fantasia
prodigiosa
alegoria
vertiginosa.
Quem me retira
este direito
que aspira
a eleito
que suspira
a satisfeito?
Tenho em mim
todas as ilusões
realidades
não vividas
superações.
Clarisse Silva
15.04.2013
quinta-feira, 7 de abril de 2011
olha-me sem dor…
Desenha-me no fundo da chávena
onde as borras do café
se esbarram no meu rosto.
Ainda me resta a cafeína
na cor da minha pele
[Naquela cor reproduzida
no pincel da chibata]
[Desenha-me de qualquer cor
pouco me importa]
Rasguei a carta de alforria,
a sentença, a liberdade condicional.
Retalhei-me por dentro e por fora
com o mesmo olhar negro,
com que retalharam a pele branca
da minha mãe…
Conceição Bernardino
sexta-feira, 4 de março de 2011
Deixa-me ler-te à luz da vela

No deserto do tempo impune
Arranquei labaredas dos teus olhos
Sem saber se as algas
Que me salgavam o rosto
Tinham o mesmo sabor frio
Das mazelas que pintei no teu corpo
Quem me dera poder apagá-las
Num simples traço a carvão
Sucumbindo em seguida
Sob os braços da Mendiga Romana
Talvez o lamaçal d’ escuridão
Que carrego nesta pena incondicional
Partisse com o clarão de luz
Que atravessa esta cela de barro
Deixa-me ler-te à luz da vela
Quando o dia se acabar
Conceição Bernardino
quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011
Adelfas selvagens…

Fala-me de ti,
não, não fales nada.
É no silêncio das palavras
que te sinto renascer nos meus braços
como as primeiras folhas que se abrem
acasaladas, no romper da Primavera.
Olha-me, deixa-me ver-te
onde o céu não se alcança,
entre a corda bamba e a nuvem mais ousada,
que mesmo vestida de negro
me acaricia a dor que já não respiro.
Deita-te a meu lado
e fala-me de ti
antes que a madrugada acorde
o silêncio das andorinhas
que hão-de chegar
despidas nos teus braços.
…fala-me de ti
antes que as nossos lábios se toquem
como duas adelfas selvagens…
Conceição Bernardino
terça-feira, 7 de julho de 2009
Vitupério sacramental
neste cavalo chamado tempo.
Deito-me
sob mármore cru,
petrificando o meu corpo
numa nudez quase imunda.
Sou carne de homem
de mulher,
vitupério sacramental.
Sinto frio
daquele amor
disperso nas folhas secas
da minha crença.
Não entendo a saudade
da saudade que já não sinto
Quero ser assim
tal como sou,
a indiferença dos diferenciados.
Vem deleitar-te comigo
A fúria com que me dissolvo em cera
Sobre a mesa enfeitada de cristais
Que me acaricias de sedas púrpuras
- Vem deleitar-te comigo
Sente os contornos do meu corpo
Vestido numa silenciosa ARPA
Com vontade de gemer pautas
Vertiginosas de deleite indefinido
Toca-me
Sente o misticismo deste som
Que penetra as profundezas
Mais nocivas até às mais impiedosas
As labaredas consomem-nos
Em chamas sôfregas de anseios
Sente cada corda que te quer
Toca-me
Faz de mim a mais bela melodia
Em gemidos celestiais
Neste inferno só nosso…
Viola da braccio
despidas de espinhos
…nuas...
Sente-me,
ama-me,
desnuda-me,
em melopeias de
um violino lascivo.
Vem,
lura esta pele impetuosa
com teu o arco dócil,
acrava o meu desejo lúbrico.
Afaga-me no teu cavalete
… faz amor comigo…
com gemidos transversais
do teu violino angélico.
Incessantemente

Desfolha as pétalas do meu corpo
sorve o néctar desta mescla,
da lonjura que nos separa
nos espinhos carentes de saudade
...calo o frio...
(como amantes ébrios)
Perdemo-nos em cartas
como dois adolescentes famintos,
em busca da puberdade
ávidos de um afago
...calo o ardor...
(corro descalça no imaginário dos teus braços)
Não demores meu amado...
Lembras-te do nosso primeiro encontro?
É lá que te espero incessantemente
como da primeira vez...
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009
Quantas Serão...
Poema escrito por Conceição Bernardino e lido por Vóny Ferreira
"QUANTAS SERÃO..."
Uma criança de olhar rasgado
impetuosa, de maus tratos
afagados de lonjura,
sequiosa de mil carinhos
brinca com a fome
nos vales da miséria,
num infantário descampado
de doença e tortura.
Já se escondem entre a morte
e o cheiro nauseabundo
de um mundo que se faz de cego
a tantos campos de concentração,
onde as crianças permanecem
sem qualquer sonho,
sem qualquer ilusão,
à espera de um tempo que não passa,
onde o sol brilha
sem qualquer graça
E a incógnita fica:
Amanhã quantas serão?
quinta-feira, 1 de janeiro de 2009
Sonho cristalino

Quando fecho os olhos
Sinto o silêncio da tua alma no meu corpo
E a brisa fresca da noite gela-me os sentidos
Perco a noção da vida, esqueço-me de viver.
A madrugada leva-me longe,
Longe do mundo e da saudade,
Dos gritos frios da monotonia.
Quanta calma, quanta paz
Abraça o meu cansaço
E despe de mim as roupas da nostalgia
Lá longe não sei aonde, aonde tudo é cristalino
Como as águas que nascem no horizonte.
Os desejos são eternos e as vontades mendigam
São como a luz de quem não vê e os olhos
Que tudo invejam
Quando fecho os olhos, não durmo, viajo
Para lá da eternidade...
domingo, 21 de dezembro de 2008
Fascinação
quinta-feira, 20 de novembro de 2008
Piano enigmático

Deitas-me sobre
teu piano enigmático,
cobres-me de olhares silenciosos
sussurras-me pautas penetrantes.
Delicio o teu sabor letal
entre as notas que escoro
na rebeldia das cores
que se curvam ao fastígio
da minha avidez lasciva.
O teu olhar predador
persiste em seguir-me
e eu não resisto
desejo ser a tua presa
a mais indomável.
Desejo ardentemente
ser possuída,
algemar a minha demência à tua...
Conceição Bernardino